Chegando onde eu jamais estive

Eu sempre gostei de Star Trek: Discovery, mas só no fim da 3a temporada eu entendi exatamente os motivos.

Chegando onde eu jamais estive

A vida -- ou, se você preferir, a minha cabeça -- só permitiu que eu assistisse aos dois últimos episódios da 3a temporada de Star Trek: Discovery essa semana, o que me fez questionar se eu devo colocar no meu Letterboxd agora que resolvi logar séries também esse ano (eu ter esquecido que assisti a DEVS me obrigou a isso), ou se deixo pra lá.

Faria sentido colocar por lá nesse momento, já que a temporada só acabou em 2021, mas a maioria dos episódios foi exibida eno ano passado... E eu até já falei dela na minha lista de Melhores de 2020™. Falei pra caralho, inclusive, mas não o suficiente. Porque esses dois últimos episódios me fizeram perceber uma coisa que eu já tinha sentido, só não tinha colocado em palavras.

Nada, absolutamente NADA, se conecta tanto comigo quanto essa série.

Durante cerca de metade da minha vida, literalmente, eu trabalhei diretamente com cultura pop. Evoluí horrores, a ponto de não conseguir assistir a nada sem #análises. Aprendi a sentir e enxergar coisas em filmes e séries e gosto muito disso, de verdade. E isso não acontece tanto com Star Trek: Discovery. Acontece bem pouco, na verdade.

Por exemplo, no penúltimo episódio da temporada, dirigido por Jonathan Frakes (o William T. Riker de Star Trek: The Next Generation), há uma certa forçada de barra na quantidade de loopings de câmera que, em certo momento, me incomodou. Primeiro eu compreendi o que tava sendo feito, mas depois só comecei a querer saber se isso era algum tipo de assinatura do diretor, que eu não sabia quem era, até então. Só que isso durou o que... 5mins? Simplesmente passou.

Em algum momento eu simplesmente ¯_(ツ)_/¯ e segui em frente. Tinha muito mais coisa importante acontecendo ali. Eu acho que é assim que as pessoas que choram com filmes como Coco e Soul se sentem, inclusive! :D

Nessa pandemia, há exatos dez meses em casa, também fica um pouco difícil não se distrair com o universo em volta de você -- das cachorras existindo ao celular que tá ali, ao alcance da mão. Mas até isso Star Trek: Discovery fez comigo: conseguiu me fazer esquecer completamente da existência do resto do mundo. Assisti aos dois episódios seguidamente, duas horas, direto.

Eu não gosto nem de filme que tem mais de 1h30, sabe? :D

Tem a Tilly, também. Enxergo alguns problemas bem grandes com o final do seu arco nessa temporada, mas é desde sempre a melhor personagem dessa série pra mim, a que mais cresce (dentro da história e pra quem assiste) e a que eu sempre me enxerguei por conta da sua ansiedade generalizada.

Ah é: tem uma gata, que é uma Rainha, na série também. :D

Se você leu a minha lista de Melhores de 2020™ e meus textos sobre filmes e séries em geral nos últimos anos, deve ter percebido que eu sempre me identifico com personagens, com histórias, com coisas mais específicas. Até em The Crown, uma série que é o mais puro suco do entretenimento e cultura pop pra mim, eu faço isso, sabe?

Mas aí eu fui procurar a idade da Sonequa Martin-Green e... bateu. Foi nesse momento que eu entendi exatamente o meu sentimento em relação à série. Star Trek: Discovery é a única coisa que me faz sentir representado na cultura pop.

São diversas as razões, como o fato de que os corpos, idades, orientações sexuais, gêneros (e falta deles) são naturalmente diversos e, em se tratando de humanos, são absolutamente iguais. É um mundo utópico, claro, e é por isso que é ficção científica e é por isso que é tão bom. Mas... A Sonequa Martin-Green, além de usar tênis com o uniforme da Federação, tem 35 anos. A Mary Wiseman também... 35 anos. Emily Coutts, 31. Oyin Oladejo, 35. Daí pra cima.

Esses três aí da frente, "The Bridge Trio", tem 35, 40 e 31 anos, respectivamente.

Em outras palavras, Star Trek: Discovery mostra um monte de gente nos seus 30+, lutando com seus mais diversos (e fortíssimos) demônios, procurando um lugar no mundo (ou no universo, no caso. Se quisermos ser bem exatos, no CONTINUUM ESPAÇO-TEMPO!) e ainda assim estão juntos, e ainda assim seguem em frente. Nunca vi algo tão ~abrangente assim, tão exato assim.

Bateu. Bateu bem. Eu consegui entender o que é se sentir representado (de fato, né, vamos deixar um pouquinho só de lado o fato de eu ser um homem, branco, cis e hétero) na cultura pop. Porque o que Star Trek: Discovery faz comigo é me ajudar a me localizar no mundo. Me dá um senso de existência. E é bom. E me faz perceber AINDA MAIS a importância disso tudo.

Porque não é fácil, não é fácil MESMO, perceber que dá pra seguir em frente. :)