O ano em que eu assisti a 52 filmes
Depois de me dar uma meta de assistir a 156 filmes em um ano, assisti a dois terços disso em dois anos. Os motivos que fizeram eu não conseguir atingir a meta em 2018 e me superar em 2019 é que são interessantes.
Nunca fui essa pessoa METAS na virada do ano, mas em 2017 eu me dei duas: ir na piscina todos os dias nos primeiros quinze dias do ano e assistir a, pelo menos, 104 filmes.
O número não era aleatório: com 104 filmes num ano, isso significa que eu teria arranjando tempo pra assistir à pelo menos dois filmes por semana, na média. Porque é, faça 29 de Fevereiro ou não, um ano sempre tem 52 semanas. E porque, bem, quanto mais filmes melhor.
A primeira meta foi bem fácil de bater. Morando num prédio com piscina, fazendo calor e eu amando água, não houve qualquer problema -- e não, falta de sol ou chuva não se caracterizam como "problemas".
A segunda meta eu consegui inclusive ultrapassar e chegar a 121 filmes, como informa meu Letterboxd. Escrevi sobre isso e alguns dos filmes que assisti e conteúdos que acabei produzindo lá no JUDAO.com.br. Foi em 2017 que conheci o cinema do Taika Waititi, que defendi Prometheus e Alien: Covenant num vídeo que foi tirado do ar (e me ajudou a desistir de produzir coisas pro YouTube)... Foi em 2017 que eu pensei em fazer uma maratona Spielberg no ano seguinte, além de assistir a 156 filmes (ou três por semana, na média). Mas foi em 2017 também, bem no final, que tive o que podemos chamar de mental breakdown, que me fez ENFIM buscar ajuda psiquiátrica e, na sequência, psicólogica.
Resultado? Acabei assistindo a 52 filmes em 2018, sendo só um deles do Steven Spielberg. Me senti decepcionado com o resultado, além de triste, já que a maioria dos filmes vistos foram por motivos profissionais. Vontade própria, aquela que me faria propositalmente sentar na frente de uma tela e assistir a alguma coisa? Fica muito complicado tê-la quando se passa pelo tal do processo de autoconhecimento. É duro, dolorido, cansativo, coloca uma nova versão de você contra uma outra mais conhecida, mais cômoda.
São só alguns determinados tipos de arte que conseguem ultrapassar essa barreira e, normalmente, elas falam sobre essas mesmas coisas. É mais fácil assistir a algo com o qual se identifica num momento de fragilidade. É como se aquele filme, ou série, te pegasse pela mão e lembrasse que a gente não tá sozinho.
Aí chegou 2019. Sem metas, sem piscinas e sem grana o suficiente para, pela primeira vez em quase duas décadas, eu não sentir o menor remorso de deixar o JUDAO.com.br em segundo plano -- o que significa sair completamente da minha zona de conforto e, claro, da minha vida trabalhando em casa pela maior parte dos dias.
Foi difícil me acostumar, fisica e mentalmente, a essa (nova) rotina. Uma rotina que me fazia, todos os dias, chegar e capotar na cama, independente de qualquer plano que eu tivesse de assistir a um filme, seja lá o tamanho que fosse. Aquele tal autoconhecimento me fez perceber que eu existo no universo, sim, mas sem entender exatamente as razões e como lidar com isso. Eu só estava cansado. Eu só vivia cansado.
Saí do emprego, os freelas pareciam todas as pessoas com as quais me relaciono, se afastando depois de um tempo de convivência; as contas começaram a apertar e, faltando poucos meses pro ano acabar, surgiu uma proposta que eu, confesso, só fui ver qual era por conta da necessidade -- o mesmíssimo motivo que me fez aceitá-la.
Nova rotina, novo cansaço, mas também uma nova perspectiva profissional que me fez reorganizar tantas coisas dentro da minha cabeça. Ficou mais fácil chegar em casa e apertar o play em um filme, em uma série. Acompanhei Watchmen e seu podcast oficial, Morning Show, Servant, The Mandalorian, assisti a sete temporadas de The Office e acabei assistindo a 52 filmes, mais uma vez.
Dessa vez, porém, foram filmes que eu queria realmente (re)assistir -- até pela impossibilidade e prioridade profissional, que agora é outra. Entre Facas e Segredos, Dora e a Cidade Perdida, Meu Nome é Dolemite, Labirinto do Fauno, Missão: Impossível - Fallout, Exterminador do Futuro: Destino Sombrio e, o meu preferido de todos, Midsommar. Não tinha exatamente um motivo: eu só queria. E eu só fui assistir.
O ponto, que me chateia de verdade, é que eu poderia ter aumentado esse número. Mas eu tive sérios problemas em sair de casa e ir ao cinema; eu tive sérios problemas com o momento de começar a assistir a um filme em casa; eu tive, e estou tendo, sérios problemas com pessoas, como escrevi aqui. Até pensei que, ao deletar o Instagram por uns dias (eu realmente queria mergulhar numa piscina e dar risadas com gente que eu gosto e gosta de mim e a total impossibilidade de que isso acontecesse me fez tomar a decisão), eu pudesse transformar esse tempo em filmes assistidos. Não deu.
Cinema pode ser parque de diversões pra um, arte pra outros. Pra mim cinema é uma base. Me ajuda a me localizar, pra mim e pro universo, pessoal e profissionalmente. Claro que nesses 52 filmes de 2019 tem coisa que vi pelo trabalho, mas a grande maioria funciona tanto no pessoal quanto no profissional. O que fica, porém, é que eu fiz o que eu tive vontade de fazer... E talvez não exista nada mais importante que isso.
2020 começa sem nenhuma meta sobre a quantidade de filmes que eu quero assistir. Mas eu espero atingí-la e até dobre. Mais do que conhecimento sobre filmes, isso vai significar muito mais conhecimento sobre eu mesmo.